Pedras no meio do caminho

XXVIII. Um puzzle complexo…

Ninguém melhor do que Almada Negreiros, num fragmento dos Painéis da Rocha do Conde de Óbidos, para nos guiar na reta final deste folhetim de folhetins. E porquê este puzzle de várias leituras e de diversos enredos?

Para lembrar como a literatura pode ser mais do que um jogo de probabilidades, uma equação com várias incógnitas. Nesse sentido, convoco diversos intervenientes nestes capítulos, à semelhança do que costuma fazer Hercule Poirot. O seu método baseia-se no caminho de uma hipótese para uma tese, com uma cuidadosa ponderação dos passos que permitam encontrar solução. E nós apenas temos uma pergunta.

Comecemos, assim, por fazer a lista dos protagonistas relevantes. Neste momento, há uma ponta solta, uma personagem, cujo destino verdadeiramente desconhecemos, mesmo tendo a tentação de perceber como Ramalho e Eça resolveram o seu mistério de Sintra. Não sabemos, do mesmo modo que como desapareceu a cabeça da célebre estátua em honra de Pacheco. Espreitemos, antes de qualquer desenvolvimento, o que o detetive Jaime Ramos escreveu em duas folhas de um velho bloco. À semelhança do que normalmente acontece, porventura a principal chave do enigma foi a que passou mais despercebida, com grande desatenção do público frequentador deste folhetim.

Eis, entre aspas, a lista que o portuense me enviou:

«O folhetim tem como protagonistas fantasmas e uma só interrogação. Qual é ela? A primeira sombra é Carlos Fradique Mendes (I), o único que existe, celebrado nas letras, mas pouco conhecido como artífice de dramas policiais. Ele aparece e reage negativamente ao ser descoberto (II). O final do Passeio Público, a Avenida da Liberdade e o Rossio são os primeiros lugares do mistério, sucedendo-lhes a Rua dos Fanqueiros do sr. Justino Antunes (III). O convento do Carmo, lugar de pedras antigas, alberga a voz soturna do coronel Segismundo, herói da pátria (IV). E irrompe em pleno Chiado o Conselheiro Acácio cheio de salamaleques perante Luísa do Primo Basílio (V). Em maré de Conselheiros, Fradique desenha o célebre Pacheco, com o País a chorar o seu génio (VI), e mais adiante virá Abranhos (XX). Mas é Zé Povinho quem desmascara a ilusão (VII). Depois dos Conselheiros, surgem os Morgados, como Joãozinho das Perdizes (VIII). E vem à baila o elogio do Pau de Marmeleiro, simbolizado pelo Bispo de Viseu (IX). E, como se não houvesse suspeitos suficientes, eis que surge Calisto Elói de Barbuda (X) e as peripécias da “Queda de um Anjo” (XI). Mas, de súbito, descobre-se um português surpreendente – Corto Maltese, neto de Frei Manuel Pinto da Fonseca, Grão-Mestre da Ordem de Malta (XII), que viaja pelo mundo (XIII). E deparamo-nos com um dos mais populares protagonistas: Sandokan de Emílio Salgari, em Mompracem (XIV) com o português Gastão de Sequeira, rapidamente chegando ao cenário da “Peregrinação” de Fernão Mendes Pinto (XV) e à Banda Desenhada de José Ruy (XVI) e, depois à alucinante viagem no mundo da ilusão: Alecrim e Manjerona (XVII), Monólogo do Vaqueiro de Mestre Gil (XVIII), bem como no campo dos folhetins – a Joaninha do Olhos Verdes (XIX)».

Por um momento interrompemos a lista.

Que procuramos? Diga-o o leitor.

Portugueses descobrimo-los em toda a parte. Todos permitem entender a lusitana gente sem a tentação de simplificar. Num jantar à portuguesa (XXI), na companhia de um Abade (XXII), numa comédia de enganos (XXIII), no encontro entre Antunes e Judite (XXIV) de que trata o puzzle complexo nos leva à interrogação de quem somos?».

Mas falta ainda saber qual o desenlace na misteriosa Estrada de Sintra…

Agostinho de Morais

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