A Vida dos Livros

UM LIVRO POR SEMANA

Quando está a terminar a apresentação pública da exposição “A Aventura da Moraes” no CNC recordamos o livro “Opressão e Liberdade” de Simone Weil, publicado em 1964, pela Moraes, na colecção “Círculo do Humanismo Cristão”, com tradução de Maria de Fátima Sedas Nunes (Maria Velho da Costa). É a primeira obra de Simone Weil publicada em língua portuguesa e permite um contacto directo com a reflexão da mística, pensadora e activista política.

UM LIVRO POR SEMANA
De 10 a 16 de Julho de 2006


Quando está a terminar a apresentação pública da exposição “A Aventura da Moraes” no CNC recordamos o livro “Opressão e Liberdade” de Simone Weil, publicado em 1964, pela Moraes, na colecção “Círculo do Humanismo Cristão”, com tradução de Maria de Fátima Sedas Nunes (Maria Velho da Costa). É a primeira obra de Simone Weil publicada em língua portuguesa e permite um contacto directo com a reflexão da mística, pensadora e activista política. O livro tem a particularidade de conter “Reflexões sobre as Causas da Liberdade e da Opressão Social”, consideradas por Weil como o seu principal trabalho, escrito em 1934. Sobre o qual disse: “é na essência uma análise da opressão política e social, das suas causas permanentes, do seu mecanismo e das suas formas actuais”. E o seu mestre Alain afirmou: “o trabalho é excelente; importa dar-lhe sequência”. Significativamente, o texto é encimado por duas citações, de Espinosa e de Marco Aurélio. Do primeiro: “No que diz respeito ao homem, nem o riso, nem as lágrimas, nem a indignação, mas o entendimento”. Do Imperador romano: “O ser dotado de razão pode transformar todo o obstáculo em matéria de trabalho, e dele tirar partido”. Simone Weil partilha connosco uma experiência espiritual que procurou ser emancipadora. Foi assim sempre ao longo da sua vida, no limiar do cristianismo, ainda que não tenha passado o umbral da conversão. “O triunfo dos movimentos autoritários e nacionalistas abalou a esperança que, por toda a parte, havia sido depositada na democracia e no pacifismo” – diz-nos Simone Weil nesse meio dos anos trinta. E continua: “o progresso técnico parece haver falhado, pois, em lugar do bem-estar, não mais trouxe às massas do que a miséria física e moral em que as vemos debater-se: tais inovações técnicas, aliás, pouco se admitem já, salvo as que se relacionam com as indústrias de guerra”. Premonitória, Weil põe o dedo na ferida, interrogando-se sobre, por exemplo, a contradição entre a preocupação emancipadora do pensamento de Marx e a prática política que se reivindica dele. Afinal, Marx omitiu a explicação sobre os motivos da opressão. Afinal, “poderosos e fracos todos se encontram submetidos à luta pelo poder”. A verdade, porém, é que “nada existe no mundo que possa impedir o homem de sentir-se nascido para a liberdade”. A liberdade constitui, assim, um valor em si, não definível apenas como ausência de opressão. A produção de coisas não é um fim, o importante é atentar às relações humanas que lhe estão subjacentes. Daí que o trabalho manual possa constituir um modo de realização humana, ligando a capacidade de criar e de ir ao encontro da dignidade pessoal. O desenvolvimento tem, pois, de ser encarado de um ponto de vista novo, “que não mais seria o do rendimento, mas o da relação do trabalhador com o trabalho”. Daí ter de ser recusada a subordinação do “destino próprio ao decurso da história”…


Guilherme d’Oliveira Martins

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