A Vida dos Livros

UM LIVRO POR SEMANA

Selma Lagerlöf (1858-1940) celebrizou-se pelas sagas de inspiração romântica que encheram o imaginário de muitos leitores da primeira metade do século XX. O livro que hoje escolhemos é da sua autoria e tem como título “Histórias Maravilhosas” (Editorial Minerva, Lisboa, s.d.). Há muito que está esgotado, só se encontra nos alfarrabistas, mas representa um tempo em que o Natal era algo mais do que a corrida às lojas e aos supermercados.

UM LIVRO POR SEMANA
De 19 a 25 de Dezembro de 2005


Selma Lagerlöf (1858-1940) celebrizou-se pelas sagas de inspiração romântica que encheram o imaginário de muitos leitores da primeira metade do século XX. O livro que hoje escolhemos é da sua autoria e tem como título “Histórias Maravilhosas” (Editorial Minerva, Lisboa, s.d.). Há muito que está esgotado, só se encontra nos alfarrabistas, mas representa um tempo em que o Natal era algo mais do que a corrida às lojas e aos supermercados. Nos anos quarenta e cinquenta era um presente de Natal muito apreciado – e muitas vezes levava os seus leitores a partirem à descoberta do país de nascimento da autora, a Suécia, através da sua obra-prima “A Viagem Maravillhosa de Nils Holgersson através da Suécia” (de 1906-07). Lagerlöf obteve o Prémio Nobel da Literatura em 1909, num momento em que estava no auge da sua produção e da sua influência. Selma dedicou estas “Histórias Maravilhosas” a sua avó. “Lembro-me bem  da avó a desfiar histórias, umas após outras, de manhã à noite, enquanto nós, as crianças, a ouvíamos muito quietas, sentadas a seu lado. Era uma vida esplêndida”. A ficção e a realidade misturavam-se, como na vida, e avó dizia “ – Tudo isto é tão verdadeiro como estar-nos a ver uma à outra”. E esse pequeno livro começa pela história do Natal, contada numa noite em que a avó e a neta ficaram em casa à espera da família que fora à Missa da Meia Noite. Era uma vez… “um homem, que já noite escura saiu de casa para pedir emprestada uma brasa a fim de acender o lume”. A sua mulher acabara de dar à luz um menino, que era preciso aquecer. Correu casas e campos e nada conseguiu. Até que avistou a fogueira de um pastor. Aproximou-se. Os cães atacaram-no, mas não o puderam ferir, o rebanho não fugiu, o pastor arremessou-lhe o cajado, mas este não o magoou. Perante tantos prodígios, o pastor disse ao homem que levasse as brasas que quisesse, julgando que isso seria impossível, pois o homem nada trazia para o efeito. Mas, para grande surpresa do pastor, o homem pegou nas brasas e não se queimou. Mas que razões haveria naquela noite para tamanhos prodígios? O pastor seguiu o homem até onde estava sua mulher e o bebé. Era uma gruta desconfortável. Ainda mais surpreendido, o pastor sentiu compaixão e pôde dar aconchego à criança, vendo-se então envolvido por anjos e cânticos, cuja origem não compreendia. A pequena Selma estava curiosa e maravilhada. E a avó disse-lhe então, para explicar os prodígios e os mistérios: “ – O que aquele pastor viu, também  nós poderíamos ver, se nos fosse permitido, pois em véspera do Natal os anjos descem dos céus”. As histórias do livro sucedem-se. É a magia da bondade que se sente a cada passo.  Dir-se-ia que a época em que Selma escrevia estava fadada para a paz e o entendimento, no entanto o fundo humanista da romancista não foi seguido ou compreendido e abriram-se as portas para a mais brutal das barbáries… E hoje, só a memória nos pode ajudar…


Guilherme d’Oliveira Martins

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