Notícias

MANOEL DE OLIVEIRA (1908 – 2015)

Manoel de Oliveira morreu na manhã desta quinta-feira, na sua casa na Foz, no Porto, pouco minutos antes do meio-dia, de paragem cardíaca.

MANOEL DE OLIVEIRA – CARTEIRA IMAGINOSA…

Manoel de Oliveira era uma personalidade fascinante. Era o Mestre. Conheci-o pessoalmente e sou testemunha da sua energia até praticamente ao fim. Hoje ouvimos um coro de elogios, mas nem sempre foi assim durante a vida – o que demonstra o seu carácter absolutamente singular e inovador.
Os testemunhos sobre a apresentação de «Douro, Faina Fluvial» foram de perplexidade ou de admiração (de poucos). A controvérsia foi evidente. Agora, não temos dúvidas sobre o extraordinário valor artístico e documental dessa obra-prima do cinema mundial. Veja-se também o «Ato da Primavera», onde a originalidade se traduz na fidelidade à vivência popular do fenómeno religioso e antropológico.
João Bénard da Costa tinha uma grande admiração pelo Mestre e tantas vezes ensinou-nos a ver com olhos de ver, na prosa luminosa que nos legou, o significado da sua obra e a extraordinária ligação à literatura. Além do mais, João foi o inconfundível Duarte de Almeida na obra de Oliveira.
Não esqueço ainda a relação muito curiosa e difícil com Agustina Bessa-Luís. Dir-se-ia que duas grandes personalidades faziam coexistir a complementaridade e a tensão. Admiraram-se sem renunciar ao sentido crítico.
Quando se estudar melhor a cultura portuguesa do século XX verificar-se-á como essa ligação representa um retrato essencial da complexidade da atividade criadora. Em mais de uma circunstância, disse que o meu filme preferido é «Palavra e Utopia», em que Luís Miguel Cintra e Lima Duarte dão vida ao «Imperador da Língua Portuguesa». Tive, aliás, o gosto especial de ter visto no Teatro Gil Vicente de Coimbra essa filme fantástico, com o Mestre e com Lima Duarte, a quem disse pessoalmente o que aqui escrevo. Aí está todo o grande cineasta – assumindo a fidelidade suprema relativamente à Palavra, através de um dos maiores génios da língua portuguesa.
Manoel de Oliveira, deixa-nos aos 106 anos, mas a sua filmografia diz tudo. Não esquecemos a projeção internacional da sua obra e o sentido de entrega total à sua arte. Por isso, ainda tinha muitos projetos na sua carteira imaginosa


Guilherme d’Oliveira Martins

 

Subscreva a nossa newsletter