Em Busca de Ideias Contemporâneas

Igual Consideração e Respeito

Folhetim de Verão “Em Busca de Ideias Contemporâneas” – capítulo 25

É normal invocar-se uma contradição insanável entre liberdade e igualdade, como se ambas não admitissem conciliação. Já vimos que entre igualdade e diferença não há incompatibilidade, pois são faces da mesma moeda. Todos somos, de facto, iguais e diferentes – cada um de nós tem identidade própria, não somos confundíveis com números, são irrepetíveis e diferentes, mas devem ser tratados igualmente, sem discriminação. Quando lemos uma distopia, como “Mil Novecentos e Oitenta e Quatro” de George Orwell (1903-1950), vemos que aí igualdade é igualitarismo e que a diferença é esquecida… Ora, relativamente à liberdade e à igualdade questão semelhante se coloca. Lembremos a etimologia mais antiga de “libertas”, tem a ver com libra, que significa balança. Liberdade tem a ver com a balança livre e equilibrada. Num prato estou eu no outro está o outro. Não há liberdade sem equilíbrio entre eu e o outro. Se o romantismo valorizou a liberdade individual e se o coletivismo deu ênfase ao igualitarismo, tantas vezes meramente formal, a verdade é que, como afirmou Norberto Bobbio (1909-2004), importa preservar a liberdade igual e a igualdade livre. Também aqui estamos diante de faces de uma mesma moeda. O século XX, e os sistemas económicos mistos valorizam a complementaridade entre liberdade e igualdade. A liberdade individual e o livre arbítrio asseguram a autonomia pessoal, a igualdade perante a lei, a justiça distributiva e a não discriminação exigem a igualdade, não confundível como homogeneização.

Segundo Isaiah Berlin: liberdade igual é liberdade e não igualitarismo limitador da singularidade. E se falamos de capital social, falamos de coesão social, de mediação pelas instituições e de equilíbrio entre autonomia e solidariedade. Ronald Dworkin (1931-2013) afirma, assim, que a conciliação necessária entre liberdade e igualdade exige que entendamos as relações humanas a partir do que designa como “igual consideração e respeito”. Que significa “igual consideração e respeito”? Seguindo o raciocínio de Dworkin a liberdade individual, para ser plenamente respeitada, pressupõe igualdade perante a lei, mas mais do que isso: um fundamento ético assente no princípio do respeito por todos e na consideração da importância fundamental do outro, bem como na igual consideração como elemento central da filosofia moral. E na conciliação entre liberdade e igualdade encontramos a Ética como indiretamente normativa, a Moral como diretamente normativa, mas não coerciva e o Direito, como diretamente normativo e coercivo. A igual consideração e respeito permite considerar a liberdade e a igualdade como irmãos gémeos. A democracia moderna assenta nessa complementaridade, obrigando à coesão social, à mediação institucional, à participação de todos e à dignidade da pessoa humana.

Relembremos Edgar Morin (1921) que considera numa cultura de autonomia e responsabilidade a necessidade de: prevenção do conhecimento contra o erro e a ilusão; de métodos que permitam ver o contexto e o conjunto, em lugar do conhecimento fragmentado; o reconhecimento do elo indissolúvel entre unidade e diversidade da condição humana; aprendizagem duma identidade planetária considerando a humanidade como comunidade de destino; exigência de apontar o inesperado e o incerto como marcas do nosso tempo; educação para a compreensão mútua entre as pessoas, de pertenças e culturas diferentes; e desenvolvimento de uma ética do género humano, de acordo com uma cidadania inclusiva. A autonomia e a solidariedade associam-se naturalmente. A liberdade e a igualdade, a igualdade e a diferença completam-se.

Subscreva a nossa newsletter