Destaque

Duarte Mendonça: o Embaixador do Jazz em Portugal

Natural de Lisboa, onde nasceu a 5 de fevereiro de 1931, no seio de uma família oriunda de Olhão e sem qualquer tradição na música, começou a interessar-se pelo jazz aos quinze anos.

Foi atraído inicialmente pelas grandes orquestras de swing de Glenn Miller e Harry James e, posteriormente, pelas orquestras de Count Basie, Tommy Dorsey e Duke Ellington. O contacto com essas formações, e também com os grandes mestres do boogie woogie, realizava-se principalmente através da AFN – American Forces Network, uma estação de rádio sediada na Alemanha pelo exército norte-americano, da emissora Voice of America e do programa Hot Club, que Luís Villas-Boas realizava desde 1946 no Rádio Club Português.

Só posteriormente surgiu a paixão pelos discos, muitos dos quais encomendava de Inglaterra ou dos EUA através de familiares e amigos, nomeadamente Gérard Castello Lopes, que o expôs àquele que foi deste então o seu grande ídolo musical, Charlie Parker, e o apresentou ao Hot Clube de Portugal.

Nos anos 1950, assistiu na discoteca Palm Beach, em Cascais, ao seu primeiro concerto de jazz ao vivo, mas o espetáculo mais marcante teve lugar no Festival de Jazz de Antibes, ao qual se deslocou propositadamente em 1963, ali presenciando a estreia europeia do novo e fenomenal quinteto de Miles Davis.

Profissionalmente, trabalhou fundamentalmente no sector automóvel, tendo colaborado nas empresas SOREL (Opel) e Ford Lusitana, mas também em empresas como a Valentim de Carvalho e a firma Azevedo e Silva.

Em 1974, foi convidado por Villas-Boas a colaborar no Cascais Jazz, dando início a uma parceria que permaneceu inalterada até 1988 e produziu vários festivais em Portugal (Figueira da Foz, Espinho, Algarve, Cascais e Lisboa) e também diversos grandes concertos, nomeadamente com Bill Evans e Eddie Gomez (1975), Art Blakey e os Jazz Messengers (1979), Horace Silver (1980), Stan Getz e Sonny Stitt (1981), Dexter Gordon (1982) e Gary Burton (1983).

Em 1982, esteve na origem do festival Jazz Num Dia de Verão e em 1990, já desfeita a parceria com Villas-Boas, fundou o Estoril Jazz (1990-2015), um dos festivais de jazz mais emblemáticos do país, e o Galp Jazz (1990-2004). Nesse mesmo ano, destacou-se com a criação dos Cursos Internacionais Projazz, a primeira grande iniciativa pedagógica realizada em Portugal na área do jazz. Através desses cursos, que tiveram uma segunda edição em 1991, inúmeros músicos portugueses, incluindo o jovem Bernardo Sassetti, puderam aprender e trocar experiências com gigantes do jazz como Clark Terry, Terence Blanchard, Kenny Burrell, Barney Kessel, Rufus Reid, Reggie Workman e Alan Dawson.

Da sua atividade como produtor fazem ainda parte o festival Women in Jazz (1996 e 1997), várias coproduções com o Centro Cultural de Belém e a Culturgest, bem como a contratação para o Casino Estoril de muitos dos grandes nomes do jazz, e não só, que ali atuaram a partir da década de 1980, nomeadamente The Manhattan Transfer (1989), a Glenn Miller Revival Orchestra (1989), Michel Legrand (1990), George Benson (1990), Tony Bennett (1998) e Paul Anka (2006).


Em 2008 e 2009, coproduziu com João Moreira dos Santos o festival Allgarve Jazz, evento que trouxe a Portugal músicos como Herbie Hancock, Chick Corea, Gary Burton, Dee Dee Bridgewater, Freddie Cole e The Manhattan Transfer.

Ao longo de mais de 40 anos de atividade como produtor, foi responsável por diversas estreias em território nacional, destacando-se as contratações de músicos como Red Rodney, The Manhattan Transfer, Michel Legrand, George Benson, Marcus Roberts, Barney Kessel, Terence Blanchard, Sheila Jordan, Lionel Hampton, Ahmad Jamal, Joshua Redman, Brad Mehldau, George Shearing, Mulgrew Miller, Jon Hendricks, Dianne Reeves e Diana Krall. Por sua iniciativa, atuaram também em Portugal cerca de 25 das maiores big bands estrangeiras, incluindo as de Gil Evans, Thad Jones/Mel Lewis, Count Basie, Woody Herman, Bill Holman, Dave Holland e a Lincoln Center Jazz Orchestra, de Wynton Marsalis.

A verdadeira cruzada que travou pelo jazz, que considerava “a melhor música do mundo”, levou-o à televisão. Na RTP, sempre em parceria com Luís Villas-Boas, foi autor de três programas, todos emitidos na década de 1980: Jazz Magazine, Clube de Jazz e Jazz para Todos.

Em reconhecimento pelo papel fundamental que desempenhou na promoção do jazz em Cascais, a autarquia local distinguiu-o em 1996 com a Medalha Municipal de Mérito Cultural. Seguiu-se, em 2004, a Medalha de Mérito Cultural, atribuída pelo Ministério da Cultura por ocasião do seu 30.º aniversário como produtor de jazz.

Faleceu aos 90 anos, no dia 13 de agosto de 2021, tendo o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, feito notar na ocasião que “a história do jazz em Portugal é também a história dos seus divulgadores, entre os quais se destacou Duarte Mendonça”.

João Moreira dos Santos
2021

Subscreva a nossa newsletter