Crónicas de Viagem - COCHINCHINA

Cochinchina – Crónica VI

A herança portuguesa no Vietname e no Camboja leva-nos aos locais de memória dos portugueses por terras da Cochinchina.

26 de agosto a 9 de setembro 2017 
Guia: Alexandra Pelúcia
No âmbito do Ciclo de Viagens “Os Portugueses ao encontro da sua História”

4 e 5 de setembro – Da Nang e Hué: entre passado e presente

Da Nang (antiga Turão; Tourane, em francês) sucedeu a Hoi An como importante porto de mar, na confluência do rio Han. Também Da Nang se está convertendo num destino turístico em crescimento acelerado graças, principalmente, às esplêndidas praias de areia branca e fina e de águas calmas que lhe ficam próximas. Da Nang é hoje a cidade mais importante do centro do Vietname.

Percorridas algumas regiões da costa e do interior do Vietname, de autocarro ou de barco, torna-se-nos por de mais evidente a omnipresença da água no território deste país: o mar (uma costa marítima extensíssima), lagos, rios e deltas, canais, irrigação dos campos de arroz e … a chuva das monções (que, apesar de a época ainda não ter terminado, só raramente nos molhou …). Foi-nos observado que o Vietname se desenvolveu como país em torno do delta do Mekong – e a presença da água proporciona-nos belas paisagens.

Atualmente, a água é certamente um fator relevante no crescimento económico e social do Vietname. O crescimento é manifesto em Da Nang no número de arranha-céus em construção, no aumento rápido de infraestruturas de uso público – 9 pontes sobre o rio Han, quando ainda há poucos anos apenas existia uma -, condomínios e resorts de luxo… Da Nang surgiu aos nossos olhos como um sinal claro da transição do Vietname de um país eminentemente rural e de economia planificada para uma economia de mercado mais diversa (em que o turismo surge como a segunda principal fonte de riqueza) e aberta ainda que sob forte controlo do Estado.

Mas há um outro lado, negro, da história de Da Nang: foi ali, na Red Beach, que as forças dos EUA desembarcaram em 1965. A cidade foi, durante a Guerra do Vietname, base logística e… de lazer das tropas americanas.

A nossa passagem por Da Nang ofereceu-nos mais uma oportunidade de revisitar a presença católica e o papel dos portugueses na história da região. Interessantíssimo foi constatar, como nos contou a Prof.ª Alexandra Pelúcia, que a própria colonização francesa teve a sua raiz na participação de missionários franceses no quadro das missões enquadradas pelo Padroado português do Oriente, na primeira metade do século XVII! Só em 1658 estabeleceria a Santa Sé as vigarias apostólicas de Tonquim e da Cochinchina chamando diretamente os franceses a colaborar. Duzentos anos depois (1858), foi alegando a necessidade de proteger os católicos contra perseguições de que estavam sendo alvo que os franceses iniciaram (com violência) um processo de domínio progressivo do Vietname que conduziu, em 1883, ao protetorado sobre a Indochina (Vietname, Camboja e Laos) e que só terminaria com um difícil processo de independência após a 2ª Grande Guerra.

De Da Nang seguimos para Hué. A caminho, de autocarro, atravessámos o célebre paralelo 17 que dividiu o Norte e o Sul do Vietname. Também Hué foi utilizada como base americana durante a Guerra.

Hué é hoje uma cidade bem desenhada com largos e bonitos jardins, na margem do rio Perfume. Mas a nossa visita de Hué justificou-se pela importância histórica de Hué, pela memória ali deixada por portugueses no século XVII e pela herança notável que representa a Cidade Imperial, classificada pela Unesco como património mundial em 1993. Hué foi capital do Vietname durante a dinastia dos Nguyên (1802-1945), aos quais se deve a reunificação do Vietname no início do século XIX.

No século XVII, no contexto do conflito entre os Thin e os Nguyen, o luso-descendente João da Cruz (c. 1610-1682), originário de Macau, filho de português e de mãe asiática, foi um importante fabricante e fornecedor de armas dos Nguyen. A sua fundição foi instalada em 1661, em Hué. Existe uma carta de João da Cruz, datada de 1670, dirigida a um jesuíta, em que é explicada a presença de jesuítas portugueses na região.

A Cidade Imperial, que percorremos com curiosidade, constitui um vasto complexo monumental de palácios, pagodes, um teatro e túmulos consagrados ao culto dos imperadores. Foi edificada durante o século XIX segundo o modelo da Cidade Proibida de Pequim. A vida da família real e da corte nesta “cidade proibida” acontecia envolta em mistério, salvo talvez as faustosas cerimónias que ali tinham lugar, todavia vedadas às mulheres, mesmo as imperatrizes e a rainha-mãe, que era alvo de especial veneração. Daí a imaginação de intrigas palacianas, concubinas, eunucos, …, que povoam as histórias publicadas sobre a dinastia dos Nguyen.  

Um tanto chocantes para nós foram as fotografias a preto e branco que ali vimos expostas mostrando cerimónias da corte, incluindo a coroação de um imperador Nguyen, já sob o domínio da França, na presença das autoridades e oficiais franceses fardados. Com a colonização francesa, o imperador converteu-se de facto numa mera “marionette”.  O Imperador Bao Dai viria a abdicar em 1945. 

10 de setembro de 2017 ® Maria Eduarda Gonçalves

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