Reflexões

De 17 a 23 de Janeiro de 2005

Realizou-se no último fim-de-semana a Ponte Cultural Lisboa/Porto, organizada de novo pelo CNC. “A cidade, os seus arredores, as praias próximas, descendo para Sul, permanecem para mim a pátria dentro da pátria, a Terra materna, o lugar primordial que me funda…

REFLEXÃO DA SEMANA
De 17 a 23 de Janeiro de 2005



Realizou-se no último fim-de-semana a Ponte Cultural Lisboa/Porto, organizada de novo pelo CNC. “A cidade, os seus arredores, as praias próximas, descendo para Sul, permanecem para mim a pátria dentro da pátria, a Terra materna, o lugar primordial que me funda. Ali estão as tílias enormes, as manhãs de nevoeiro, as praias saturadas de maresia, os rochedos cobertos de algas e anémonas, as Primaveras botticellianas, os plátanos, a cerejeira, as camélias…” – disse Sophia. E D. António Ferreira Gomes, o grande Bispo do Porto, considerou a cidade como “terra de liberdade, de lealdade, de cultura e de trabalho”. Falar do Porto, passar no Campo Alegre, olhar o mar na Foz, gozar o sol e a maresia foi lembrar a sabedoria poética e o sentido livre que a poeta tão bem soube interpretar. E tudo isto foi recordado, em romagem, à beira Douro, numa cidade de comerciantes e de poetas – que Ruben A. retratou com ironia e fair play… Nada se pode comparar ao Natal do Campo Alegre, entre as tradições da consoada portuguesa e das festas nórdicas… Eugénio de Andrade diz que “a cidade o que tem, sobretudo, é carácter – um carácter que faz do cidadão do Porto o mais belo estilo de se ser português”. Raul Brandão invocou o Porto “filho do rio e do mar”. Jaime Cortesão recordou os portuenses que conquistaram “as suas liberdades palmo a palmo, em luta armada com os seus bispos, de quem a cidade fora senhorio feudal, e com os turbulentos fidalgos de Entre Douro e Minho…”. Deste modo se criou no Porto uma “verdadeira república urbana, como as suas congéneres da Flandres e da Itália”, distinguindo-se destas “pelo profundo sentimento de comunhão com que compartilhava as aspirações e os riscos da pátria maior”. Aí “burgueses e mesteirais organizaram-se como classe e conquistaram as garantias de liberdade, sem as quais o trabalho se torna servidão e a vida perde dignidade”. E não afirmou Nemésio que o Porto era “a raiz territorial e étnica que deu crescimento ao país”? Eugénio de Andrade lembra três figuras que se tornaram, cada uma à sua maneira, símbolos da cidade – Fernão Lopes, Almeida Garrett e Camilo. O Porto de Agustina Bessa Luís invoca “uma paixão e um selo de resistência”. Toda a cidade tem “uma alma de muralha” – muralha, “que infunde em nós uma doce tristeza europeia, um orgulho de actividade, um desenho de pompas escravas, um sonho económico, uma impraticável fé de liberdade”. No Palácio da Bolsa homenageámos Mário Cláudio e, naturalmente, Agustina. No Campo Alegre fizemos romagem ao jardim de Sophia, lugar de magia único (da “Floresta” ou do “Rapaz de Bronze”) e aos domínios onde o mundo começou à procura de Ruben A.. Mas o Porto moderno e cosmopolita de hoje passa pela Casa de Serralves, onde fomos ver Paula Rego em todo o seu esplendor, encruzilhada complexa de talento e de interrogação.

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