Reflexões

De 22 a 28 de Novembro de 2004

“O referendo sobre o novo Tratado Constitucional europeu já está no horizonte. É indispensável que haja um debate autêntico e sério. Haverá quem diga que é difícil discutir um tema com muitas implicações. Não podemos, porém, descrer da democracia. (…)”

REFLEXÃO DA SEMANA


De 22 a 28 de Novembro de 2004


O referendo sobre o novo Tratado Constitucional europeu já está no horizonte. É indispensável que haja um debate autêntico e sério. Haverá quem diga que é difícil discutir um tema com muitas implicações. Não podemos, porém, descrer da democracia. E caberá a quantos se empenharem no esclarecimento dos cidadãos fazer compreender o que está realmente em causa nesta decisão, com recusa de simplificações e caricaturas, falsificações e inverdades. Vejamos o que está em debate. Não se trata de dizer se somos a favor da integração europeia. Essa opção foi oportuna e legitimamente adoptada, com resultados positivos para o desenvolvimento do País e para a convergência da nossa economia com os nossos parceiros da União. Não se trata de aceitar ou recusar aquilo que no Tratado Constitucional não é novo e é mera reprodução do que já existe – o que se passa com a longa parte terceira, relativas às políticas da União, que se mantém por existir uma continuidade em relação ao caminho gradual que vem desde a fundação das Comunidades. Não se trata ainda de discutir o primado do Direito Comunitário sobre o Direito dos Estados, uma vez que esse princípio (agora limitado e clarificado) faz parte, desde os anos sessenta, do código genético da União. Trata-se, sim, de nos pronunciarmos sobre o que é novidade no novo Tratado – a começar na integração da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, dotada de força obrigatória. E este é um dos factos que dá natureza constitucional ao novo Tratado. Por outro lado, há um quadro orgânico e institucional novo que pretende responder ao facto de a União ter passado a ser integrada por vinte e cinco Estados-membros. As competências dos Estados-membros ficam clarificadas, como as que não cabem na esfera das competências próprias da União nem dos poderes partilhados entre a União e os Estados. Estamos perante uma União de Estados livres e soberanos, baseada na legitimidade dos Estados e dos cidadãos. Passará a haver um Presidente do Conselho Europeu designado por um período de dois anos e meio, renovável uma vez. O Parlamento Europeu, eleito pelos cidadãos europeus, verá as suas competências políticas e legislativas reforçadas. A Comissão Europeia, como executivo da União, verá reafirmados os seus poderes de iniciativa legislativa, enquanto órgão de defesa dos interesses comuns europeus. Os cidadãos verão, assim, reforçada sua influência – enquanto o risco da existência de um Directório de países grandes poderá ficar reduzido, se houver uma vontade comum de contrariar os egoísmos nacionais e de dar prioridade à defesa dos valores e interesses comuns. É nesta ordem de ideias que se abre a porta (timidamente e sem consequências reais imediatas) às decisões por maioria qualificada, no âmbito das competências da União. O novo Tratado é um avanço. Recusá-lo é continuarmos na fase transitória de agora – com os egoísmos a ditarem a sua lei. Não será?  


Guilherme d’Oliveira Martins

Subscreva a nossa newsletter