Reflexões

De 1 a 7 de Dezembro de 2003

João Guimarães Rosa disse um dia que “mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende”. A afirmação aplica-se bem ao ensaísta brasileiro António Candido, Prémio Camões, com quem tive o gosto de estar há dias em S. Paulo. António Candido, nasceu no Rio em 1918, viveu a primeira infância em Minas Gerais e formou-se num tempo em que a literatura portuguesa constituía a parte fundamental das boas bibliotecas brasileiras. Tem, por isso, viva a memória da sua paixão juvenil por Antero de Quental, do deslumbramento causado por Oliveira Martins – desde o “Portugal Contemporâneo” às… “Tábuas de Cronologia” – e da admiração pela obra fantástica de Eça de Queirós…

João Guimarães Rosa disse um dia que “mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende”. A afirmação aplica-se bem ao ensaísta brasileiro António Candido, Prémio Camões, com quem tive o gosto de estar há dias em S. Paulo. António Candido, nasceu no Rio em 1918, viveu a primeira infância em Minas Gerais e formou-se num tempo em que a literatura portuguesa constituía a parte fundamental das boas bibliotecas brasileiras. Tem, por isso, viva a memória da sua paixão juvenil por Antero de Quental, do deslumbramento causado por Oliveira Martins – desde o “Portugal Contemporâneo” às… “Tábuas de Cronologia” – e da admiração pela obra fantástica de Eça de Queirós. Por mais de uma vez, invocou os poemas de Antero, os textos épicos da “República Romana”, para acabar com a descrição dos sonhos de Gonçalo na “Ilustre Casa”… Ao sabor da conversa, falámos animadamente da biblioteca de seu pai. Hoje já pouco se conhece no Brasil da literatura portuguesa contemporânea. Fomos então à literatura brasileira – de Euclides da Cunha e da descrição da luta messiânica de António Conselheiro em “Os Sertões” (1902), do nascimento do modernismo, com Manuel Bandeira ou Ribeiro do Couto, e sobretudo de Mário de Andrade, a partir de “Paulicéia Desvairada” (1922) sobre a metrópole paulista e o seu vertiginoso desenvolvimento. Professor e cidadão, António Cândido nunca se eximiu a exprimir a sua opção política. Não regateia elogios ao Presidente Lula, que apoiou, como um dos fundadores do PT. “Hoje, ao contrário de há muitos anos, não estou na oposição” – diz-nos… E defende “uma socialização pelo amadurecimento, apoiada na democracia e realizando, pela liberdade, os ideais de justiça sem os quais o homem não se realiza como homem”. Apesar de agnóstico, António Candido fala com entusiasmo na viragem da Igreja brasileira e na importância do Concílio Vaticano II e do magistério de Alceu Amoroso Lima e de D. Paulo Evaristo Arns – que o convidou para a Comissão Justiça e Paz de S. Paulo, em nome do diálogo com a cultura e com a modernidade, para que se abrissem as portas e as janelas da Igreja aos ventos do espírito… O ensaísta recorda esse tempo como um momento único, criativo e fecundo de consciência social… Celso Lafer, António Candido e eu desfiámos durante mais de duas horas um rosário interminável de memórias, que correram sem que déssemos pelo tempo. Fica a lição sobre a originalidade do Brasil. Di-lo em “O Romantismo do Brasil” (2002): “Foi por meio de empréstimos ininterruptos que nos formámos, definimos a nossa diferença relativa e conquistámos consciência própria. Os mecanismos de adaptação, as maneiras pelas quais as influências foram definidas e incorporadas é que constituem a “originalidade” que no caso é a maneira de incluir em contexto novo os elementos que vêm de outro”.

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